terça-feira, 1 de março de 2011

PLANOS PROTEGEM A AMAZÔNIA

Quando o governo do Peru decidiu explorar o petróleo de um santuário da natureza na região de San Martín, a existência de um plano-diretor para administrar essa reserva a salvou de um futuro de poços e oleodutos. O caso ilustra a importância dos planos-diretores neste país dono de uma grande diversidade biológica e paisagística e de um subsolo rico em minerais e hidrocarbonos.

Entretanto, das 57 áreas naturais protegidas confirmadas apenas 35% contam com este planejamento, destinado a manejar de forma sustentável seus recursos naturais. A Área de Conservação Regional Cordilheira Escalera de San Martín alimenta as bacias dos rios Cumbaza, Cayanarachi e Shanusi, das quais dependem mais de 300 mil pessoas. Ao ver que o governo central autorizava a exploração petroleira, autoridades e habitantes de San Martín entraram com uma ação de amparo aceita em 2009 pelo Tribunal Constitucional, com o argumento da existência do plano-diretor.

Esse plano, antes aprovado pelo conselho regional de San Martín, incluía o zoneamento da terra e das atividades econômicas possíveis, e estabelecia a área onde se queria extrair o petróleo como zona intocável. “Os planos-diretores são muito importantes. O que se estabelece aí deve ser executado em termos de gestão, zoneamento e validação com os atores envolvidos”, explicou ao Terramérica a representante da não governamental Associação Amazônica pela Amazônia, Karina Pinasco.

O Peru tem, segundo dados do final de 2010, 71 áreas naturais protegidas administradas principalmente pelo Estado, 57 com categoria definitiva e 14 transitórias (não obrigadas, portanto, a terem plano-diretor até ser definida sua situação). Das áreas confirmadas, que devem contar com esse planejamento, 20 não a têm. Por quê? Elaborar “leva tempo porque exigem estar de acordo com a população. Não é o mesmo na zona costeira e na Amazônia, onde devem ser considerados os usos e costumes dos habitantes” nativos, disse ao Terramérica o diretor de Desenvolvimento Estratégico do Serviço Nacional de Áreas Naturais Protegidas pelo Estado (Sernanp), Jeff Pradel.

O serviço que Jeff dirige existe há apenas dois anos, quando foi criado o Ministério do Meio Ambiente. Para fazer um plano, são necessárias reuniões de informação com a população local, que deve validar o processo. Nas 20 áreas protegidas que ainda não o têm, há planos operacionais anuais que servem de diretriz para as ações, explicou Jeff. Além disso, o decreto supremo 003-2011 estabeleceu que o expediente de criação e zoneamento das novas áreas constitui um plano-diretor preliminar.

Nos objetivos de médio prazo traçados pelo Centro Nacional de Planejamento Estratégico a proposta é chegar a 2021 com 80% das áreas protegidas com planos-diretores, uma das metas para o bicentenário da independência que será comemorado nesse ano. Contudo, há outros problemas, como o custo de cada plano, que varia entre US$ 5 mil e US$ 20 mil, a burocracia e uma visão “pretensiosa” desta ferramenta, afirmou o especialista Pedro Solano, da não governamental Sociedade Peruana de Direito Ambiental.

“São superdimensionados e se pretende que reúnam aspectos que muitas vezes não podem ser cumpridos, estende-se o processo até três anos e acabamos ficando na fase de planejamento e executamos muito pouco por falta de tempo e recursos”, disse Pedro ao Terramérica. Como requer uma atualização a cada cinco anos, o planejamento deve ser mais simples e vinculado à realidade, acrescentou. Entretanto, continuam crescendo na selva peruana os projetos de mineração e de hidrocarbonos. Mais de 70% do território amazônico está coberto de concessões petroleiras.

O ordenamento territorial, coração do plano-diretor, permitiria priorizar legalmente a proteção das áreas de selva ricas em biodiversidade. Assim, “uma zona qualificada como silvestre ou de proteção rígida determina que ali não será permitida nenhuma infraestrutura”, explicou Pedro. Em sua opinião, a melhor estratégia é conseguir que a população e as autoridades assumam as áreas naturais como patrimônio a serem geridos para benefício de todos. “Devem ser sinônimo de educação ambiental, turismo, orgulho, e não serem vistas apenas como um lugar de proibição, mas de fazer coisas”, acrescentou.

Embora o Sernanp esteja melhorando, falta colocar em prática modelos de gestão interessantes, como os projetos de conservação privada e comunitária impulsionados pela sociedade civil. No Peru, são 28 áreas de conservação privada, dez elaboraram seu plano-diretor e sete estão em processo de elaboração, disse Jeff.

Segundo Pedro, se for reconhecido o valor destas áreas, as decisões que priorizam atividades extrativistas podem ser neutralizadas, como ocorreu na Serra do Divisor, uma área reservada nas regiões Ucayali e Loreto, Nordeste do país, que tem importante função de captar água e abriga, por exemplo, mais de 12 espécies de macacos. Apesar de ser necessária a consulta ao Sernanp antes de ser autorizada uma atividade econômica ali, o Ministério de Minas e Energia expediu autorizações de exploração petrolífera, interpretando que a consulta deve ser feita apenas antes da prospecção. “Costuma-se contornar as leis”, concluiu Pedro.

Artigo produzido para o Terramérica, projeto de comunicação dos Programas das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e para o Desenvolvimento (Pnud), realizado pela Inter Press Service (IPS) e distribuído pela Agência Envolverde.

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